A medicina humana não admite a existência do
Espírito, não reconhecendo, conseqüentemente, as doenças espirituais. No
passado, porém, durante séculos, o Espírito era considerado causa de doença,
principalmente na loucura onde parecia evidente seu parentesco com o mal.
Quando a Medicina começou a descobrir a fisiologia mecanicista dos fenômenos
biológicos, excluiu dos meios acadêmicos a participação da alma, inclusive na
criação dos pensamentos, que passaram a ser vistos como “secreção” do cérebro,
e as doenças mentais, como distúrbios da química dos neurônios.
O médico espírita que pretender retomar, nos dias de
hoje, a discussão sobre as doenças espirituais precisa expurgar, em primeiro
lugar, a “demonização” das doenças, um ranço medieval que ainda contamina
igrejas e repugna o pensamento médico atual.
A medicina moderna aprendeu a ajuizar os sintomas e
os desvios anatômicos, usando sinais clínicos para fazer as classificações das
doenças que conseguiu identificar. Para as doenças espirituais, porém, fica
faltando conhecer “o lado de lá” de cada paciente para podermos dar um
diagnóstico correto para cada necessitado. Já no século XVII, Paracelso
atribuía causas exteriores ou perturbações internas aos doentes mentais,
destacando os lunáticos (pela interferência das fases e movimentos da Lua), os
insanos (pela hereditariedade), os vesanos (pelo abuso de bebida ou mau uso de
alimentos) e os melancólicos (por um vício de natureza interna).
Para as doenças espirituais também percebemos causas
externas e internas. Por enquanto, nossa visão parcial nos permite apenas uma
proposta onde constem as possíveis causas da doença espiritual, sem o rigor que
uma avaliação individual completa exigiria, adotando-se para tanto a seguinte
classificação: doenças espirituais auto-induzidas (por desequilíbrio vibratório
e auto-obsessão), doenças espirituais compartilhadas (por vampirismo e
obsessão), mediunismo e doenças cármicas.
As Doenças Espirituais auto-induzidas
Por desequilíbrio vibratório
O perispírito é um corpo intermediário que permite
ao espírito encarnado exercer suas ações sobre o corpo físico. Sua ligação é
feita célula a célula, atingindo a mais profunda intimidade dos átomos que
constitui a matéria orgânica do corpo físico. Esta ligação se processa pelas
vibrações de cada um dos dois corpos – físico e espiritual – cujo “ajuste”
exige uma determinada sintonia vibratória. Como o perispírito não é prisioneiro
das dimensões físicas do corpo de carne, podendo manifestar suas ações além dos
limites do corpo físico pela projeção dos seus fluidos, a sintonia e a
irradiação do perispírito são dependentes unicamente das projeções mentais que
o espírito elabora, do fluxo de idéias que construímos. De maneira geral, o ser
humano ainda perde muito dos seus dias comprometido com a crítica aos
semelhantes, o ódio, a maledicência, as exigências descabidas, a ociosidade, a
cólera e o azedume entre tantas outras reclamações levianas contra a vida e
contra todos. Como o vigiai e orai ainda está distante da nossa rotina,
desajustamos a sintonia entre o corpo físico e o perispírito, causando um
“desequilíbrio vibratório”. Essa desarmonia desencadeia sensações de mal-estar,
como a estafa desproporcional e a fadiga sistemática, a enxaqueca, a digestão
que nunca se acomoda, o mau humor constante e inúmeras outras manifestações
tidas como “doenças psicossomáticas”. Ainda nos dedicamos pouco a uma reflexão
sobre os prejuízos de nossas mesquinhas atitudes, principalmente em relação a
um comportamento mental adequado.
Por auto-obsessão
O pensamento é energia que constrói imagens que se
consolidam em torno de nós. Impressas no perispírito elas formam um campo de
representações de nossas idéias. À custa dos elementos absorvidos do fluido
cósmico universal, as idéias tomam formas, sustentadas pela intensidade com que
pensamos nelas. A matéria mental constrói em torno de nós uma atmosfera
psíquica (psicosfera) onde estão representados os nossos desejos. Neste
cenário, estarão todos os personagens que nos aprisionam o pensamento pelo amor
ou pelo ódio, pela indiferença ou pela proteção, etc. Medos, angústias, mágoas
não resolvidas, idéias fixas, desejo de vingança, opiniões cristalizadas,
objetos de sedução, poder ou títulos cobiçados, tudo se estrutura em “idéias-formas”
na psicosfera que alimentamos, tornando-nos prisioneiros dos nossos próprios
fantasmas. A matéria mental produz a “imagem” ilusória que nos escraviza. Por
capricho nosso, somos, assim, “obsedados” pelos nossos próprios desejos.
As doenças espirituais compartilhadas
Por vampirismo
O mundo espiritual é povoado por uma população
numerosíssima de Espíritos, quatro a cinco vezes maior que os seis bilhões de
almas encarnadas em nosso planeta. Como a maior parte desta população de
Espíritos deve estar habitando as proximidades dos ambientes terrestres, onde
flui toda a vida humana, não é de se estranhar que esses Espíritos estejam
compartilhando das nossas condutas. Podemos atraí-los como guias e protetores,
que constantemente nos inspiram, mas também a eles nos aprisionar pelos vícios
– o álcool, o cigarro, as drogas ilícitas, os desregramentos alimentares e os
abusos sexuais. Pare todas essas situações, as portas da invigilância estão
escancaradas, permitindo o acesso de entidades desencarnadas afins. Nesses
desvios da conduta humana, a mente do responsável agrega em torno de si
elementos fluídicos com extrema capacidade corrosiva de seu organismo físico,
construindo para si mesmo os germens que passam a lhe obstruir o funcionamento
das células hepáticas, renais e pulmonares, cronificando lesões que a medicina
considera incuráveis. As entidades espirituais viciadas compartilham dos
prazeres do vício que o encarnado lhes favorece e ao seu tempo estimulam-no a
nele permanecer. Nesta associação, há uma tremenda perda de enrgia por parte do
encarnado. Daí a expressão vampirismo ser muito adequada para definir esta
parceria.
Por obsessão
No decurso de cada encarnação, a misericórdia de
Deus nos permite usufruir das oportunidades que melhor nos convém para
estimular nosso progresso espiritual. Os reencontros ou desencontros são de
certa maneira planejados ou atraídos por nós para os devidos resgates ou para
facilitar o cumprimento das promessas que desenhamos no plano espiritual. É
assim que, pais e filhos, reencontram-se como irmãos, como amigos, como
parceiros de uma sociedade. Marido e mulher que se desrespeitaram, agora se
reajustam como pai e filha, chefe e subalterno ou como parentes distantes, que
a vida dificulta a aproximação. As dificuldades da vida de uma maneira ou de
outra vão reeducando a todos. Os obstáculos que à primeira vista parecem
castigo ou punição trazem no seu emaranhado de provas a possibilidade de
recuperar danos físicos ou morais que produzimos no passado.
No decorrer de nossas vidas, seremos sempre
ganhadores ou perdedores na grande luta da sobrevivência humana. Nenhum de nós
percorrerá essa jornada sem ter que tomar decisões, sem deixar de expressar
seus desejos e sem fazer suas escolhas. É aí que muitas e muitas vezes contrariamos
as decisões, os desejos e as escolhas daqueles que convivem próximo a nós. Nos
rastros das mazelas humanas, nós todos, sem exceção, estamos endividados e
altamente comprometidos com outras criaturas, também exigentes como nós, que
como obsessores vão nos cobrar noutros comportamentos, exigindo-nos a quitação
de dívidas que nos furtamos em outras épocas. Persistem como dominadores
implacáveis, procurando nos dificultar a subida mais rápida para os mais
elevados estágios da espiritualidade. Embora a ciência médica de hoje ainda não
a traga em seus registros, a obsessão espiritual, na qual uma criatura exerce
seu domínio sobre a outra, é, de longe, o maior dos males da patologia humana.
Por mediunismo
São os quadros de manifestações sintomáticas apresentadas
por aqueles que, incipientemente, inauguram suas manifestações mediúnicas. Com
muita freqüência, a mediunidade se manifesta de forma tranqüila e é tida como
tão natural que, o médium, quase sempre ainda muito jovem, mal se dá conta de
que o que vê, o que percebe e o que escuta de diferente. Outras vezes, os
fenômenos são apresentados de forma abundante e o principiante é tomado de
medos e inseguranças, principalmente, por não saber do que se trata. Em outras
ocasiões, a mediunidade é atormentada por espíritos perturbadores e o médium se
vê às voltas com uma série de quadros da psicopatologia humana, ocorrendo
crises do tipo pânico, histeria ou outras manifestações que se expressam em
dores, paralisias, anestesias, “inchaço” dos membros, insônia rebelde,
sonolência incontrolável, etc. Uma grande maioria tem pequenos sintomas
psicossomáticos e se sente influenciada ou acompanhada por entidades
espirituais. São médiuns com aptidões ainda muito acanhadas, em fase de
aprendizado e domínio de suas potencialidades, uma tenra semente que ainda
precisa ser cultivada para se desabrochar.
Por “doenças cármicas” (compromissos adquiridos)
A “doença cármica” é antes de mais nada uma
oportunidade de resgate e redenção espiritual. Sempre que pelas nossas
intemperanças desconsideramos os cuidados com o nosso corpo e atingimos o
equilíbrio físico ou psíquico do nosso próximo, estamos imprimindo estes
desajustes nas células do nosso corpo espiritual. É assim que, na patologia
humana, ficam registrados os quadros de “lúpus” que nos compromete as artérias,
do “pênfigo” que nos queima a pele, das “malformações” de coração ou do
cérebro, da “esclerose múltipla” que nos imobiliza no leito ou das demências
que nos compromete a lucidez e nos afasta da sociedade.
Precisamos compreender que estas e todas as outras
manifestações de doença não devem ser vistas como castigos ou punições. O
Espiritismo ensina que as dificuldades que enfrentamos são oportunidades de
resgate, as quais, com freqüência, fomos nós mesmos quem as escolhemos para
acelerar nosso progresso e nos alavancar da retaguarda, que às vezes nos mantém
distantes daqueles que nos esperam adiante de nós. Mais do que a cura das
doenças, a medicina tibetana, há milênios atrás, ensinava que médicos e
pacientes devem buscar a oportunidade da iluminação. Os padecimentos pela dor e
as limitações que as doenças nos trazem sempre possibilitam esclarecimento, se
nos predispormos a buscá-lo. Mais importante do que aceitar o sofrimento numa
resignação passiva e pouco produtiva é tentar superar qualquer limitação ou
revolta, para promovermos o crescimento espiritual, através desta descoberta
interior e individual.
(Dr. Nubor Orlando Facure – Neurologista)
Artigo inserido no Jornal Espírita de julho de 2004